quarta-feira, 29 de abril de 2009

Eu estava ali, deitado no sofá do terraço, esperando. Como não podia fazer mais nada além disso, acabei tentando arranjar alguma diversão que não me obrigasse a sair da posição budista vulgarmente conhecida como “Buda espera o carro que não chega nunca”. Primeiro ensaiei algumas reclamações básicas sobre o clima, o dia, mas como isso não funcionou, tentei apelar para divagações existenciais ridículas e precárias. Cheguei então a uma conclusão interessante, ainda que besta: “esperar é ser obrigado a não fazer nada”.

É assim: se você está esperando alguém, suas ações começam a ser pensadas e pesadas a partir dessa situação. Por mais que o outro lado esteja uma hora e meia atrasado, qualquer decisão que não seja continuar esperando pode atrapalhar tudo. Por exemplo, se você decide ir dormir enquanto a pessoa não chega, vai para a cama pensando “Porra, mas e se ele chegar, me chamar e eu não ouvir? Ou pior, se disserem que eu não estou em casa?”; se você decide ir ali no padeiro da esquina comprar umas besteiras, logo começa a criar um roteiro de desencontro mirabolante, que envolve telefonemas, decepções e um pão de ontem; se vai tomar água, engole tudo rápido, já que é feio deixar alguém te chamando na porta da sua casa, principalmente no sol quente. O compromisso da espera está lá e você tem de honrá-lo.

Mas ai desisti e vim escrever. Acabei lembrando do Fassbinder e do seu filme simpático “Beware of the holy whore”.

segunda-feira, 13 de abril de 2009

Muita coisa pra nada

Acordei cedo, com dor no estômago, e a primeira coisa que vi quando abri os olhos foi um vulto fantasmagórico passando pela fresta da porta do banheiro. Fraqueza, enjôo, vontade de vomitar e um extra de “Poltergeist” querendo tomar banho. Ótima segunda-feira para você também, mundo surreal.

Pâmella já tinha me alertado sobre um certo ser de branco que ela vira noites atrás, no mesmo local, mas, como bom agnóstico de merda que sou, acabei fazendo apenas algumas piadinhas inofensivas. Lembrei do dragão do Carl Sagan, que, além de não poder ser visto, cospe fogo invisível, e pensei que, caso, a aparição não fosse só uma aparição – e nem um pai de santo com vontade de cagar –, poderia ao menos trocar o papel higiênico, limpar o chuveiro, passar pano, sei lá. Obviamente, tais conclusões sumiram quando fui dormir e repassei seqüências inteiras de “O exorcista” e “O Iluminado”, filmes feitos exclusivamente para serem lembrados em horas ruins (que vão de madrugadas insones até discussões no meio da tarde com cinéfilos de óculos de aro grosso).

Como a dor no estômago era mais forte que o medo que começara a se instalar pela minha espinha, soltei um “puta que pariu” blasé, me levantei e fui arranjar o que fazer. Inspecionei o banheiro assombrado, fui ao PC checar e-mails e terminei amaldiçoando o clima chuvoso que havia se instalado na cidade. Era como ter ido dormir em Campina Grande e acordar em Manchester, só que sem os atrativos da cidade inglesa – Amigão x Old Trafford? Banda Afrodite x Morrissey? –. Pensei que poderia ser pior, e logo a minha memória tratou de confirmar tudo: dia de reuniões, encontros, metas... Podre. Se o inferno existe, ele está dentro de uma sala com várias pessoas reunidas, com burocracias, papéis, dados, opiniões e prazos para mais um encontro... Tudo feito com um linguajar elaborado, expressões acadêmicas, “Destarte, senhor”, “Discordo, caro mestre”, “4ª feira”, “Att.”, etc.

Sim, odeio reuniões. Mais do que dores de estômago, aparições saídas de um conto do Blackwood e cinéfilos com óculos de aro grosso, que A-D-O-R-A-M-D-E-P-A-I-X-Ã-O tudo o que o Kar-wai fez, incluindo aquele curta em 8mm filmado quando o cineasta tinha dez anos e recordava sonhos molhados com a prima. Quando não falam dele, discutem se o Almodovar é colorido demais, ou se o Pasolini... ah, sempre esquecem dele.

Hmm, mudei de idéia. O inferno é uma salinha minúscula, com vários cinéfilos discutindo assuntos que não vão pra lugar nenhum, limpando os óculos indies e brigando para saber quem tem aquele DVD com cenas excluídas do Jerzy Walderokwitcz, rei do whitexploitation underground polonês.

E meu estomago ainda dói.